7 de novembro de 2009

Precisando de um piquenique


Ser adulto não é nada fácil. Decisões a tomar, contas a pagar e a prestar, responsabilidades, prazos, consequências. Mas por trás de um adulto maduro, há sempre uma criança nem sempre feliz. Um restinho de humanidade pede socorro para não ser sufocado pela falta de um ombro pra chorar, por uma manhã de sábado triste e vazia ou por uma saudade apertada.

Para cuidar da criança esquecida que existe em cada um de nós, recomendo receitas como essa, com cara de infância feliz e família atenciosa:

Bolo Pic-nic

1 xícara de chá de manteiga
2 xícaras de chá de açúcar
3 ovos
2 xícaras de chá de farinha de trigo
1 xícara de chá de caldo de laranja (ou leite se quiser fazer um bolo básico)
1 colher de sopa de fermento em pó

É assim que faz:

Bata a manteiga com o açúcar e as gemas,na batedeira ou a mão mesmo.
Vá colocando aos poucos o caldo (ou o leite, até obter uma mistura cremosa. Junte então os ingredientes restantes(farinha e fermento. Batendo muito bem. Despeje numa assadeira tamanho médio ou forma redonda com buraco no meio, bem untada com manteiga.
Asse em forno moderado. Deixe esfriar e desenforme.

Gracias à Tânia pela receita.

2 de outubro de 2009

Hoje é dia de pastel com caldo de cana!


Depois de um longo tempo longe daqui, apareci pra falar de comida, mas não vou dar nenhuma receita. Não que eu não tenha realizado, nos últimos tempos, bons e maus experimentos culinários (um bom foi um filé à moda tailandesa, delícia. Um ruim, por exemplo, foi o meu espaguete ao pesto, horroso).

O lance é que, por conta de uma obrigação burocrática, fui a um lugar inusitado hoje, que me deu vontade de escrever. Pasmem, não foi um restaurante chique de Brasília, ou uma casa de hambúrgueres da moda. Foi a Rodoviária do Plano Piloto, esse lugar mal cuidado e lotado de gente e de poluição.

Mas, felizmente, nem tudo é feio por lá. Na rodoviária tem comida, muita. Lá na rodoviária tem doces, vários – daqueles que o pessoal distribui em dia de São Cosme e Damião, em festas juninas e afins. Tem também fotógrafo lambe-lambe, engraxate, policial militar e lojas de “novidades” – isso mesmo, aquelas lojas que vendem tudo e não vendem nada ao mesmo tempo. Lá na rodoviária tem cheiro de povo, tem gente na rua, tem vida e tem Brasil.

Tem também pastel – da Viçosa – servido com caldo de cana: verdadeira tradição de Brasília e verdadeira síntese da alma do brasileiro (to querendo dar uma de Lula agora): cana, queijo, uma massa bem gostosa frita no óleo de soja. Olha quantas commodities só nessa receita! Não deu tempo de comer o pastel, mas fiquei com água na boca. E, se comesse, faria uma das minhas coisas prediletas da infância: pingaria umas gotinhas de limão no meu caldo, pra deixar tudo mais equilibrado.

Sei que não tem a ver com o tema do blog, mas... Lá também tem revistas, muitas. Só não as desse mês. E olha que ótimo, elas custam bem mais barato: quem jamais pensou em pagar R$ 4,50 por uma Marie Claire?

Inté mais ver.

Ah, para quem ficou curioso sobre a foto, olha aí: http://www.paroutudo.com/coberturas/20090218/

15 de julho de 2009

Gilberto Freyre e Eu


Eu e Gilberto Freyre temos algumas coisas em comum, e não achem vocês que é o tom racista dos argumentos. Compartilhamos, sim, e principalmente, a paixão pelo Nordeste e o gosto pela boa mesa. Gostei deste artigo - que me foi enviado por um amigo que achou o blabláblá a minha cara :) - e resolvi compartilhar com meus leitores. Bem escrito e muito gostoso de ler. Foi publicado na Revista O Cruzeiro, aquela que todo bom (e mau) estudante de Comunicação já leu alguma vez na vida.

Sintam-se à vontade para contribuir com mais textos bons assim.


Mapa culinário do Brasil

Venho há anos tentando organizar um mapa culinário do Brasil em que se exprima uma geografia não da fome, mas da velha e autêntica glutoneria brasileira. Que entre nós existe glutoneria, sem deixar de haver fome. Existe a arte da boa cozinha, sem deixar de haver falta ou escassez de carne sangrenta, legume verde e até peixe fresco para serem cozinhados de gostosas maneiras tradicionais e regionais.

Um mapa culinário do Brasil, fixando as principais especializações regionais da cozinha nacional, começaria com o sarapatel de tartaruga do Amazonas a e sopa de castanha do Pará: o Pará do açaí. Mas não pararia no açaí. Não ficaria no Pará. Viria até o churrasco sangrento à moda do Rio Grande do Sul, acompanhado de mate amargo. Incluiria o "barreado" paranaense. O lombo de porco mineiro. O vatapá baiano. O cuscus paulista. O sururu alagoano. A fritada de caranguejo paraibana. O arroz de cuchá maranhense. O quibebe do rio Grande do Norte. A paçoca cearense. O pitu pernambucano.

Êsse mapa hei de publicá-lo um dia: um mapa a côres, acompanhado de guia para o turista que deseje viajar pelo Brasil sabendo que pratos característicos deve pedir em cada região principal do país cujo encanto queira surpreender pelo paladar e não apenas pelos olhos e pelos ouvidos. Será êsse guia companheiro do livro Açúcar, de cujas receitas caras e complexas, só para dias de jantar ou almoço de festa - às vezes se queixam as moças mal iniciadas na arte dos quitutes e na Ciências da Economia Doméstica. Mas não as boas quituteiras nem as sólidas donas de casa. Pois estas sabem adaptar as velhas receitas aos novos tempos.

Ainda a pouco, fiquei maravilhado com um bôlo Souza Leão saboreado no Rio de Janeiro, à sobremesa de jantar caprichado: jantar de bodas de prata. "Receita de Açúcar" - informa-me gentilmente a dona da casa que não é nenhuma milionária. Lembrei-me então que aquêle segredo ou mistério de família eu o conseguira, com muitos rogos, de distinta sinhá pernambucana que, por sua vez, o desencantara com muita diplomacia e talvez até algum feitiço - o feitiço da persuasão feminina - de velha parenta, para quem a receita ortodoxa do bôlo Souza Leão era só aquela: as outras ela considerava heresia ou "invenção".

Êsse mistério e vários outros, Açúcar revelou-os. São doces e bolos - os reunidos no livro - difíceis de fazer e alguns - concordo - arcaicos. Interessante só para o etnógrafo ou o sociólogo. Suas receitas chegam até nós do tempo que sinhás dengosas e negras escravas se orgulhavam de saber fazer doces difíceis para regalo dos homens e delícia dos meninos; e desdenhavam os doces fáceis e simples. Havia tempo, vagar e fartura para os doces difíceis. Que as donas de hoje procurem compreender o passado brasileiro refletido nas páginas daquele livro em vez de simplesmente se queixarem das receitas do livro Açúcar, considerando-as "erradas", tôda vez que não conseguem transporta-las do papel à panela, reduzindo o número de ovos e a quantidade de manteiga.

Mas isso é outro aspecto do assunto. O que me interessa no momento é tentar a organização de outro mapa culinário do Brasil, além do anunciado no comêço desta nota. Neste outro mapa culinário do Brasil, se fixariam especializações não só regionais como municipais, de mesa e sobremesa.

Querem os leitores de O CRUZEIRO, espalhados por todo êste vasto Brasil cooperar comigo na tentativa de organização de mapa assim minucioso? É só me escreverem, indicando quitutes que dêem fama aos seus municípios de origem ou residência. Procurem ser exatos e precisos. Acompanhem a indicação de receita. Assinem. O enderêço dêste cronista é: Apipucos, Recife. Pernambuco.

Fonte: FREYRE, Gilberto. Mapa culinário do Brasil. O Cruzeiro. Rio de Janeiro, 24 nov. 1951. Pessoas, Coisas e Animais.

4 de junho de 2009

Curry Thai


Sempre ouvi falar de comida tailandesa, mas só ultimamente ela se tornou uma realidade mais palpável do que a boca salivando diante de um livro de receitas. O traço mais marcante é, claro, a pimenta. Vermelha, verde, seca, fresca, misturada nos molhos ou solita mesmo.

Muita coisa é dita sobre a pimenta – faz mal, faz bem, faz suar, ter dor de cabeça. Uma vez que eu amo o gostinho, prefiro acreditar que ela é afrodisíaca e faz muito bem pra saúde. Mais ou menos na mesma linha da minha atitude diante do café, outra paixão antiga.

Como gosto de compartilhar as novidades com quem está por perto, resolvi apresentar uma receita de curry tailandês – que experimentei na casa do de um amigo com vasta experiência culinária adquirida numa cozinha tailandesa nos States – à minha família, por ocasião do aniversário da minha mãe.

Mas já adianto: só quem gostou foi a parte heterodoxa do clã (essa parte foi para dar um toque Caras ao blog). Os conservadores torceram o nariz quando experimentaram a iguaria. Eu, como sou a embaixadora dos heterodoxos e oprimidos, adorei. A receita, além de desafiar os sentidos - uma vez que nossa comidinha brasileira, apesar de maravilhosa, é bem diferente -, é prática e rápida. Não exige nenhuma experiência extraordinária do cozinheiro.

- abobrinhas
- cenouras
- brócolis
- cogumelos shitake e shimeiji
- tofu
- carne que você preferir (em geral, curry verde fica bom com carne vermelha; o vermelho fica bom com frango e frutos do mar, principalmente camarão e vieiras).
- caldo de legumes (pode ser feito em casa ou usar o de tablete)
- pasta de curry (o de preferência)
- leite de coco
-manjericão


Comece com o curry na panela, refogando em óleo quente. Espere que ele solte o aroma e aí vá acrescentando os ingredientes: parte do caldo, leite de coco, e os legumes e carnes na ordem do cozimento (os que demoram mais, a gente põe antes). Se quiser botar carne, camarão ou tofu, é bom refogar rapidamente numa panela a parte e depois acrescentar no cozidão.

Sirva com arroz de jasmim (aquele tailandês compridinho) e com um punhado de manjericão por cima do curry.

A pasta de curry é vendida em bons mercados e mercearias e em lojas de produtos orientais.

Dá pra beber um viozinho tranquilamente e colocar a fofoca em dia enquanto a panela está no fogo.

Beijos e Hasta!

Ah, por algum motivo, achei que essa receita combina perfeitamente com a faixa “Little Bit” do CD Half the Perfect World, da Madeleine Peyroux. Recomendo fortemente essa combinação.

28 de abril de 2009

Thyme is on my side


Ervinhas e temperos são o segredo do sabor. Sim, porque as comidas deixam de ser triviais e passam a ser especiais quando há aquele toque de incomum que nem sempre sabemos identificar de onde vem. O post de hoje tem um desses trunfos: tomilho. Eu sei que ninguém dá muita bola pra ele nas receitas. Não e muito fácil de encontrar no mercado, nem sempre sabemos identificar quem é na prateleira, essas coisas. Mas o fato é que, apesar das dificuldades (feira do bairro, mercado, chuva torrencial etc) o risoto do domingão se beneficiou do tomilho. E como.

Ingredientes:

400g de arroz arbóreo
Uma cebola grande
1l de caldo de legumes fervendo
Manteiga sem sal
Tomilho fresco (se não achar, usa o seco mesmo)
Duas cabeças de alho assadas inteiras no forno, por aproximadamente meia hora - depois desse tempo tire do forno e descasque os dentinhos
250g de amêndoas e 1,5 pão francês em migalhas - os dois ingredientes torrados juntos no azeite
Um pote de cream cheese

O básico do risoto é sempre o mesmo, portanto não irei me deter muito nesse ponto. Se não sabe nem o básico, dá uma olhada nesse post:

http://semcentidos.blogspot.com/2006_05_07_archive.html

Siga tudo isso e pare antes de chegar no limão.

Quando estiver quase pronto, acrescente os alhos inteiros, o tomilho. Continue mexendo e acrescentando o caldo fervente. Para finalizar, ponha a manteiga – eu usei dois supernacos sem sal – acerte a pimenta do reino, o parmesão ralado na hora e desligue o forno.

Na hora de servir, o toque final está na misturinha do pão torrado com amêndoas e no mascarpone. Como sempre, não encontrei esse último no mercado do bairro, então fui de Philadelphia Cream Cheese. Ponha o risoto, uma colherada generosa de cream cheese e, por cima, a farofinha de amêndoas com pão. Nice.

Foto da Fe Velloso.

25 de abril de 2009

Bolo de castanha


Esse bolito foi feito num dia em família. Tava meio dodói e resolvi ir pra cozinha pra ver se espantava a febre e o cansaço. Não deu muito certo, continuei meio muzambuja. O bolo, no entanto, ficou gostosinho.

As fotos são da Fê, que resolveu passar o dia em família comigo. O grande salvador da receita foi meu pai, que deu a idéia de rechear com Nutella. Ruim não poderia ter ficado. Em vez de usar farinha, usei uma mistura sem glúten da minha mãe, que não pode comer esse ingrediente.

Anotem aí:

5 gemas
5 claras em neve
200 gr de açúcar
250 gr de nozes moídas (usei castanhas do pará)
15 gr de farinha de trigo
10 gr de fermento em pó.

Preparo:
- Bata as gemas com o açúcar. Junte as nozes moídas, a farinha e o fermento. Misture e junte também as claras em neve.
- Coloque em duas formas redondas untadas e asse por aproximadamente 20 minutos.

Recheie com nutella.

Docinho indiano


Se você estiver passando pela Índia, traga um docinho pra mim. É de Ghee, manteiga clarificada, que dizem fazer um bem danado pra saúde. Se é saudável eu não sei, mas que é bom, isso é. O que eu experimentei se chama Soan Papdi (Premium), da marca Haldiram's.

Leva açúcar, ghee, farinha de trigo, Gram Flour, amêndoas e pistache, além de sementes de pepino e cardamomo. Bom, muito bom.

7 de abril de 2009

Clarice e os sentidos


Clarice Lispector é uma das gratas surpresas da maturidade pra mim. E, assim como a tarefa de descobrir e desenvolver os sentidos, a tarefa de entendê-la requer tempo e dedicação; atenção. Um dia eu chego lá. Por enquanto, um trecho de Água Viva. Mistura tudo que eu gosto: dama da noite, música, tempo e a busca pela essência.

“Agora é um instante. Você sente? eu sinto. O ar é it e não tem perfume. Também gosto. Mas gosto de dama da noite, almiscarada, porque sua doçura é uma entrega à lua. Já comi geléia de rosas pequenas e escarlates: seu gosto nos benze ao mesmo tempo que nos acomete. Como reproduzir em palavras o gosto? O gosto é uno e as palavras muitas. Quanto à música, depois de tocada, pra onde ela vai? Música só tem de concreto o instrumento. Bem atrás do pensamento tenho um fundo musical. Mas ainda atrás há o coração batendo. Assim o mais profundo pensamento é um coração batendo”.

Perfeito para ler na companhia de um Haagen Dazs de chocolate belga.

28 de fevereiro de 2009

Shimeji com saquê



Lojinha de comida é tudo. Lojinha de comida na companhia de sua melhor amiga de infância no dia do Ano Novo chinês é algo para ficar para a posteridade. Assim foi na minha última visita a São Paulo. Depois de quase dez anos sem uma oportunidade de estar a sós com uma das minhas melhores companhias da vida, passamos um fim de semana juntas em Sampa (ela trabalhando e eu batendo perna) e acabamos o passeio na comemoração do ano novo Chinês na Liberdade – paraíso das lojas de comida.

Pra variar, minha mala voltou cheia de coisinhas ótemas: shitakes, chá de jasmim, saquê e até gengibre. (na verdade, tive que botar tudo na mala de mão e virei motivo de chacota do carinha do Raio X do aeroporto...). Mas valeu a pena.

Fiquei enrolando pra testar a receita, mas ando inspirada para cozinhar ultimamente e, de fato, a combinação saiu melhor do que eu esperava. Não duvidem: o álcool, neste caso, faz toda a diferença:

Uma bandejinha de shimejis frescos
Um cálice de saquê
Três colheres generosas de manteiga sem sal
Shoyo
Cebolinha
Sal

Comece lavando os cogumelinhos e separando os gomos. Depois dê uma escorrida na água e coloque a manteiga pra derreter. Em seguida, cogumelinhos na panela. Cozinhe por uns oito minutos, acrescente o saquê e deixe mais uns três. Depois shoyo e acertar o sal. Eu não coloquei nenhum, porque esse molho já é bem salgado. No final, acrescente as cebolinhas. Se eu não me engano, também coloquei pimenta do reino moída na hora.

Comemos nossos cogumelitos com pão. No dia seguinte, o resto dos cogus virou a cerejinha do bolo de uma torta de legumes.

26 de fevereiro de 2009

Beringela – Da cuca para o papel


Caríssimos leitores. Sempre duvidei que vocês existissem, mas meu ceticismo não é suficiente para me fazer desistir de compartilhar receitas, ainda que seja com ninguém. Portanto, o assunto de hoje é o mistério das receitas inexistentes formalmente, mas existentes nas panelas – e no estômago. Algo como o direito costumeiro ou os acordos de cavalheiros que funcionam na prática mas que nunca serão positivados.

Pois bem. Uma dessas é a de uma pasta de beringela que fiz ano passado lá em casa, numa festinha para os amigos, que incluiu um caldo verde, pastinha de tomate e outras cositas mais, que só quem tava lá teve a oportunidade de experimentar. A tal pasta é derivada de uma receita compartilhada comigo por uma das minhas roomies queridas, o Pacote. Originalmente, ela levava alho, tomate e alguma outra coisa que não me lembro. Já a minha versão ficou sem tomate e ganhou uma coisa que eu amo demais: gergelim torrado. Então, o que só existia na minha cuca, agora está no papel, devidamente conservada para a posteridade:

Duas beringelas médias assadas no forno (limpas e com casas. A gente põe no forno e deixa lá, até elas ficarem bem murchinhas e moles)
Uns três dentes de alho
Gergelim torrado
Pimenta do reino
Azeite, do bom

Então. Depois que as beringelas estiverem desse jeito horroroso que eu descrevi, tire do forno, abra a casca com uma faca e raspe bem a polpa da beringela, já direto para o liquidificador. Depois, coloque o gergelim torrado (eu compro o cru e torro, com cuidado, na frigideira), os dentinhos de alho, o azeite e as pimentas. Bata tudo com muito azeite. O ideal é comer com pão sírio ou pita.